Nos seus primeiros 100 dias como novo presidente dos Estados Unidos Donald Trump tem levado a sério uma de suas principais promessas de campanha: examinar acordos comerciais internacionais buscando proteger os interesses do país. Após recuar em relação a algumas declarações mais contundentes direcionadas à política comercial com a China, o governo americano elegeu como “bola da vez” os contratos comerciais com o Canadá. Um dos principais imbróglios comerciais existentes entre os dois países é, sem dúvidas, a madeira serrada exportada pelo Canadá para os Estados Unidos.
Recentemente a Forest2Market do Brasil publicou um artigo abordando o término do chamado Softwood Lumber Agreement (SLA) e as possíveis oportunidades decorrentes para o Brasil. O SLA era um acordo de comércio existente entre o Canadá e os Estados Unidos, criado para compensar o subsídio recebido pela indústria madeireira canadense. Como grande parte das propriedades produtivas está na mão do governo, o valor da madeira em pé é definido administrativamente e não com base no mercado, criando um descompasso significativo com o país vizinho, principal comprador de madeira serrada do Canadá.
O secretário de Comércio norte americano, Wilbur Ross declarou no final de Abril que serão adotadas novas e rígidas taxas sobre a madeira serrada que é expedida para os EUA. As alíquotas de tais taxas irão variar entre 3 a 24% para cinco madeireiras específicas canadenses, e 20% para as demais e deverão ser válidas já nas próximas semanas (o governo não explicou a razão da diferença entre as alíquotas). Porém, como era de se esperar, tais taxas não foram bem recebidas pelo Canadá e a discussão deverá se prolongar.
“O governo do Canadá discorda fortemente da decisão do Departamento de Comércio dos EUA em impor uma taxa injusta e punitiva”, disseram Jim Carr, Ministro de Recursos Naturais, e Chrystia Freeland, Ministra de Assuntos Internacionais, em uma declaração conjunta. Segundo Carr e Freeland, "a acusação (dos EUA) não tem fundamento”. Eles alertaram que a medida irá gerar impacto negativo nas famílias americanas, que terão que pagar mais para construir ou reformar suas casas. Além disso, os ministros canadenses disseram que o país pode processar os EUA, se necessário.
Do outro lado da fronteira, o presidente da US Lumber Coalition, Cameron Krauss destacou que “as regras atuais confirmam que as madeireiras do Canadá são subsidiadas pelo governo e se beneficiam de políticas de preços e outros subsídios que prejudicam as fábricas americanas e seus trabalhadores.”
A disputa comercial sobre madeira serrada é um assunto denso que envolve mais variáveis do que aquelas que normalmente são divulgadas. Existe uma correlação muito forte entre essa disputa e o imenso mercado consumidor de produtos florestais dos EUA, o que a torna ainda mais relevante.
Se as projeções da Forest2Market estiverem corretas, o número de housing starts (novas residências) – um dos principais indicadores do setor florestal norte-americano - atingirá algo em torno da marca de 1,3 milhão de unidades em, 2018, o que fará com que a demanda de madeira dos EUA suba acima de 100 bilhões de metros cúbicos pela primeira vez desde 2007. Se a economia continuar a melhorar, a demanda por madeira serrada continuará forte em curto prazo. Embora as projeções de housing starts ainda estejam muito aquém do nível de consumo pré 2008, esse é sem dúvida o cenário mais positivo dos últimos anos.
É importante ter em mente que a discussão entre EUA e Canadá não é nova. O SLA impôs restrições similares por 10 anos antes de seu término, em 2016. Com as novas taxas a serem impostas pelos Estados Unidos espera-se que o Canadá – que nunca esteve plenamente satisfeito com o acordo anterior e que absolutamente não concorda com as novas taxas – direcione sua madeira serrada para outro grande mercado, como a China (o Canadá é o segundo maior fornecedor de madeira serrada da China, ficando atrás apenas da Rússia).
Considerando o tamanho do mercado de madeira serrada dos EUA, as importações do Brasil e de outros países da América do Sul ainda são pouco expressivas. Porém, com preço alto e demanda crescente o cenário torna-se favorável para novos players internacionais. Os acontecimentos recentes mostram que existirão oportunidades para empresas que têm se planejado atender ao mercado externo e aguardam pacientemente o melhor momento para entrar no mercado norte americano.
Embora o atual volume de madeira brasileira não seja significativo para os EUA as exportações brasileiras de diferentes produtos de madeira tem uma importância crescente para o setor. Após a crise de 2008-2009 a indústria madeireira soube se beneficiar do momento cambial positivo e intensificou suas exportações, seguindo a alta do dólar, sobretudo após 2011. Conforme demonstra a figura 01, essa tendência se confirma para produtos de menor valor agregado (madeira serrada e compensado de pinus). Mesmo com a recente queda na taxa de câmbio, as exportações destes dois produtos continuavam crescentes até o mês de Abril deste ano.
Fonte: ABIMCI e Forest2Market do Brasil
Figura 01. Evolução da exportação de madeira serrada e compensado pelo Brasil (média mensal)
No caso de Produtos de Maior Valor Agregado (PMVA) percebe-se a mesma tendência a partir de 2011. A figura 02 apresenta a evolução das exportações de portas e madeira perfilada nos últimos anos. Ao contrário da madeira serrada, do compensado e da madeira perfilada, o setor de portas apresentou uma queda no nível de exportações dos primeiros meses de 2017, acompanhando a redução da taxa de câmbio.
Fonte: ABIMCI e Forest2Market do Brasil
Figura 02. Evolução da exportação de portas e madeira perfilada pelo Brasil (média mensal)
Se analisarmos os países de destino da madeira serrada exportada pelo Brasil observamos que os EUA são o principal destino desse produto, com 35%, seguido de México (22%) e China (15%), conforme apresenta a figura 03.
Fonte: ABIMCI e Forest2Market do Brasil
Figura 03. Destino das exportações de madeira serrada de pinus, em 2017
Porém, se analisarmos produtos de maior valor agregado observamos que a importância dos Estados Unidos é muito maior, pois o país recebe 53% das exportações de portas do Brasil e 95% das exportações de madeira perfilada de pinus, conforme apresenta a figura 04.
Fonte: ABIMCI e Forest2Market do Brasil
Figura 04. Destino das exportações de PMVA de pinus, em 2017
Se a taxa de câmbio representou nos últimos anos um importante agente catalisador do aumento das exportações de produtos de madeira brasileiros para os EUA e outros mercados, atualmente as dúvidas quanto ao suprimento e o preço atrativo da madeira serrada em dólares nos Estados Unidos poderá incentivar a continuidade do crescimento das exportações de produtos de madeira para o país. As empresas brasileiras devem se organizar e permanecerem atentas aos próximos acontecimentos da relação comercial entre Estados Unidos e Canadá.